Observação de Rudymara: Nesta parábola Jesus mostra que: 1º - não basta crer Nele, tem que seguir seus ensinamentos de caridade e amor, "a cada um segundo suas obras" ; 2º - sofrerá após a desencarnação aquele que sabe o que deve fazer e não faz, "muito será cobrado a quem muito foi dado"; 3º - a salvação não é por religião é pela pratica da caridade, "fora da caridade não há salvação"; 4º - que ninguém ficará dormindo após a desencarnação esperando o juizo final; 5º - só levamos após a desencarnação os bens espirituais, "ajuntai tesouro no céu onde a ferrugem e a traça não corroe e o ladrão não rouba"; 6º - que é possível os mortos (desencarnados) voltarem para falar com os vivos (encarnados), apesar de nem sempre ser necessário.
Jesus contou a seguinte parábola: "Havia um homem rico, que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e que todos dias se banqueteava esplendidamente. E um mendigo chamado Lázaro, coberto de chagas, ficava deitado no seu portão, desejoso de fartar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e até os cães vinham lamber-lhe as úlceras. Morreu o mendigo, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico, e foi sepultado. No Hades, estando em tormentos, levantou os olhos e viu ao longe Abraão e Lázaro no seu seio, e clamou: Pai Abraão, tem compaixão de mim! E manda a Lázaro que molhe a ponta do seu dedo, e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Mas Abraão retrucou: filho, lembra-te que recebeste os teus bens na tua vida, e Lázaro do mesmo modo os males; agora, porém, ele está consolado, e tu, em tormentos. Demais, entre nós e vós, medeia um grande abismo, e de modo que os que querem passar daqui para vós não podem, nem os de lá passar para nós. O rico replicou: Pai, eu te rogo, então, que o mandes à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos, para os avisar, a fim de não suceder virem eles parar neste lugar de tormento. Mas Abraão disse: Eles têm Moisés e os Profetas: ouçam-nos. Respondeu ele: Não, Pai Abraão, mas se alguém dentre os mortos for ter com eles, hão de arrepender-se. Replicou-lhe Abraão: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tão pouco se deixarão persuadir, ainda que algum dos mortos ressuscite".
Abraão foi o Patriarca dos Hebreus, alta personagem do Antigo Testamento, em quem a fé mais se acrisolava, mais viva e rutila se mostrava, a ponto de não vacilar em sacrificar seu filho Isaac, para obedecer às ordens que havia recebido do Alto. Abraão era um crente sincero na Imortalidade: via o Espaço semeado de Espíritos, conversava com os Espíritos daqueles que nós chamamos, indevidamente, mortos, vivia em relações continuas com o Mundo dos Espíritos, que era o seu Seio predileto, que era o seu Paraíso, o seu Céu, a sua delicia, a sua felicidade.
O Hades eram as regiões infernais na Mitologia Grega, correspondente ao Tártaro dos romanos e equivalente ao Inferno aceito pelos católicos e protestantes. Não deve ser entendido como um "lugar", mas como um estado de espírito, isto é, um estado de profundo sofrimento. Quando se diz que o Espírito "entrou no Hades", isto quer dizer, figuradamente, que ele tomou conhecimento de si mesmo, viu-se na sua profunda miséria moral, cuja conseqüência é um indizível sofrimento e a impossibilidade de se aproximar dos Espíritos felizes.
Esta parábola narra a sorte de dois Espíritos após uma existência terrena, em que um escolhera a prova da riqueza, e o outro a da pobreza.
O primeiro, como em geral acontece a todos os ricos, esquecido das leis de amor e fraternidade que devem presidir às relações dos homens entre si, empregou seus haveres exclusivamente na ostentação, no luxo, no prazer pessoal, demonstrando-se insensível e indiferente à miséria e aos sofrimentos do próximo;
O segundo, faminto e doente, relegado ao mais completo abandono, suportou humildemente, sem revolta, as dores e privações que lhe martirizaram a existência.
Afinal, fazem a passagem para o outro lado da vida, onde a situação de ambos se modifica por completo.
O rico, porque vivera egoisticamente e fora desumano, deixando que um pobre enfermo passasse fome à porta de seu palácio, enquanto se regalava com opíparos jantares regados a vinhos e licores, começou a ser torturado por um profundo sentimento de culpa, enquanto Lázaro, por haver sofrido com paciência e resignação as agruras da vida misérrima que levara, gozava, agora, indizível ventura em elevado plano da espiritualidade.
Nessa conjuntura, suplica o rico seja permitido a Lázaro ir amenizar-lhe a sede que o atormenta. Evidentemente, sede de consolação, sede de misericórdia, pois, como Espírito, não iria sentir necessidade de água material.
É-lhe esclarecido, então, o porquê de seu atual padecer e o da felicidade de Lázaro, situação essa impossível de ser modificada de pronto, em virtude do "abismo" existente entre ambos. Como facilmente se percebe, também aqui não se trata de abismo físico, mas sim moral. Havendo triunfado em sua provação, Lázaro alcançara um estado de paz interior que o mau rico não poderia experimentar, e este, em razão de seu fracasso, sentia-se angustiado e abrasado de remorsos, coisas que o outro, logicamente, não poderia sentir, pois os estados de consciência são pessoais e impermutáveis.
Lembra-se o rico, então, de pedir fosse o espírito de Lázaro enviada à presença de seus irmãos para avisá-los do que lhe sucedera, a fim de se corrigirem a tempo e evitarem iguais padecimentos, post-mortem.
A negativa de Abraão, ao dizer: "Eles têm lá Moisés e os profetas: que os escutem", foi muito lógica, pois ninguém precisa de orientação particular para nortear sua conduta, quando já tenha conhecimento dos códigos morais vigentes.
O mau rico insiste, porém, no pedido em favor de seus irmãos, argumentando que, ante a manifestação de um morto, eles haveriam de penitenciar-se do personalismo egoísta que também os caracterizava.
Retruca Abraão, fazendo-o sentir a inutilidade dessa providência, pois se eles não praticavam os preceitos de solidariedade humana ensinados por Moisés e pelos profetas, cuja autoridade era reconhecida por todo o povo judeu, muito menos haveriam de ouvir e atender ao que lhes fosse dito pelo espírito de Lázaro.
Como se vê, esta parábola confirma plenamente dois pontos básicos da Doutrina Espírita:
Primeiro, o de que as penas ou recompensas futuras são consequentes aos feitos de cada um, e não baseadas em questões de fé, como se diz por aí.
Segundo, o de que as comunicações de além-túmulo são possíveis, fazendo parte da crença universal desde aqueles tempos, conquanto pudesse haver, como ainda hoje os há, incrédulos sistemáticos, que as neguem.
Rodolfo Calligaris
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