Há Espíritos que se liguem particularmente a um
indivíduo para protegê-lo?
Há o irmão espiritual, o que chamais o bom Espírito ou o bom gênio. (questão
489)
Conta o evangelista Mateus, no capítulo II de suas
anotações, que Herodes, o Grande, apavorou-se com a notícia de que nascera em
Belém um menino da linhagem de David, que seria o rei dos judeus, tirando-lhe o
trono.
Sem saber exatamente quem era nem quando se dera o
nascimento, concebeu uma solução simplista e drástica, típica dos tiranos
sanguinários: determinou que naquela cidade e adjacências fossem mortos todos
os meninos com idade abaixo de dois anos.
Calcula-se que perto de trinta crianças foram
barbaramente assassinadas no famigerado episódio que ficou registrado como
"a matança dos inocentes".
No entanto, um anjo apareceu em sonho,
recomendou-lhe que tomasse o menino e sua mãe, fugindo com eles para o Egito.
Obediente, o carpinteiro seguiu a orientação e
salvou Jesus da sanha assassina de Herodes.
Temos nesta passagem evangélica o mais famoso
episódio envolvendo a ação dos anjos de guarda, seres espirituais que, segundo
a tradição cristã, tem a missão de proteger os homens.
Eles estão presentes em todas as culturas, sob
várias denominações - gênios, fadas, deuses, protetores, guias -, sempre
empenhados em prestar assistência aos seus tutelados.
O manto de fantasia que envolvia o assunto foi
desvelado pela Doutrina Espírita, que confirma sua existência e revela que não
se situam como seres especiais, de natureza distinta da criatura humana.
São Espíritos como nós, mais evoluídos e habilitados
a nos amparar nas experiências reencarnatórias.
Não fomos criados todos ao mesmo tempo.
Não detemos a mesma idade espiritual ou o mesmo grau
de maturidade.
Situamo-nos em variados estágios de aprendizado, em
degrau compatível com nossas necessidades, lembrando a escada de Jacó da
alegoria bíblica, que vai da Terra ao Céu.
Cumprindo a Lei de Amor, que rege o Universo, os que
avançam nos domínios da compreensão e da responsabilidade ocupam-se em ajudar
os irmãos que seguem atrás, estabelecendo elos de solidariedade entre os filhos
de Deus.
Num momento de má inspiração, Thomás de Aquino, em
sua famosa Teológica, proclamou que a felicidade dos habitantes do Céu é
contemplar a infelicidade dos que jazem no inferno.
Isso é puro sadismo.
O mesmo que visitar hospitais para nos regozijarmos
com nossa saúde, ou penitenciárias para a satisfação de estarmos em liberdade,
ou os pobres para gozarmos nossa condição melhor. Semelhantes iniciativas
seriam a consagração do egoísmo.
Aprendemos com a Doutrina Espírita que a felicidade
do Céu é socorrer a infelicidade da Terra.
Exatamente o que fazem os Espíritos evoluídos,
conscientes de que no empenho de amparar seus irmãos está sua realização como
filhos de Deus.
Geralmente o anjo de guarda é alguém ligado ao nosso
coração.
Compomos famílias espirituais que evoluem em
conjunto, amparando-se mutuamente. Neste particular podemos considerar que não
temos um único protetor espiritual, mas muitos, todos aqueles que, no Plano
Espiritual ou na Carne, nessa vida ou no Além, situam-se em condição e
disposição de nos ajudar.
Haverá anjo de guarda mais prestimoso, mais
cuidadoso, mais preocupado com seu protegido do que um coração materno?
Problemas seriam solucionados, angústias seriam
amenizadas, sentimentos de solidão e abandono se enfumaçariam se em todas as
situações guardássemos a certeza de que "lá em cima" há gente que
gosta de nós, que se preocupa conosco. Gente que nos acompanha, gente que nos
inspira, gente que nos ampara, gente que torce para que façamos o melhor.
A condição do anjo de guarda depende de nossa
posição evolutiva e do que fazemos na Terra. Missionários com nobres tarefas,
contam, obviamente, com benfeitores de elevada hierarquia a assessorá-los.
Podemos considerar Chico Xavier um dos grandes
missionários de nosso tempo, com uma portentosa obra mediúnica que nos oferece
inigualável soma de informações sobre a vida espiritual.
O mentor de Chico é Emmanuel, nobre entidade cuja
sabedoria podemos avaliar examinando os livros de sua autoria, psicografados
pelo médium. Emmanuel já era um Espírito evoluído ao tempo em que Jesus esteve
na Terra. No livro "Há Dois Mil Anos" temos notícia de que ele foi o
senador Públio Lentulus. Foi também o Padre Damiano, do inesquecível romance
"Renúncia". E destacou-se como Padre Manuel de Nóbrega, fundador da
cidade de São Paulo.
O Padre José de Anchieta, companheiro de Nóbrega em
lides missionárias, guarda uma certa identidade psicológica com Chico Xavier.
Há, ainda, sugestiva semelhança física.
Algo fundamental em relação aos anjos de guarda:
·
estão perto de nós e nos inspiram na razão direta de nossa ligação com
os valores espirituais e inversa de nosso apego aos vícios e paixões da vida
material.
·
Aproximam-se quando cultivamos o bem e a verdade.
·
Afastam-se quando nos prendemos a interesses rasteiros.
·
Instrumento de nossa comunhão com eles: a oração.
Em "O Evangelho Segundo o Espiritismo",
quando aborda a prece, Kardec destaca a importância de nos dirigirmos ao nosso
mentor espiritual. O Codificador oferece vários exemplos de orações dessa
natureza.
Numa delas diz assim:
"Espíritos bem-amados, anjos guardiães que, com a
permissão de Deus, pela sua infinita misericórdia, velais sobre os homens, sede
nossos protetores nas provas da vida terrena. Dai-nos força, coragem e
resignação; inspirai-nos tudo o que é bom, detende-nos no declive do mal; que a
vossa bondosa influência nos penetre a alma; fazei sintamos que um amigo
devotado está ao nosso lado, que vê nossos sofrimentos e partilha das nossas
alegrias."
Não devemos ver nessa oração uma fórmula verbal,
cujo mérito esteja em sua simples enunciação. É um exemplo de como devemos
orar, numa conversa íntima em que procuramos os Espíritos amigos, abrindo-lhes
nosso coração.
Para que colhamos plenamente os benefícios do
contato com os amigos espirituais não podemos esquecer um detalhe: É
preciso que façamos nossa parte.
Um homem desempregado buscou serviço em inúmeras
empresas, ao longo de vários dias.
Esforço inútil. Nada dava certo.
Angustiado ante as privações que entravam em seu
lar, orou contrito, implorou a Deus lhe enviasse um anjo de guarda para
ajudá-lo.
Pouco depois, como de costume, dirigiu-se à agência
de empregos. De passagem por uma banca de jornais, veio-lhe o impulso de ler os
anúncios classificados. Comprou o jornal. Havia uma oferta que não estava bem
de acordo com sua qualificação profissional. Não obstante, resolveu tentar.
Conversou com o entrevistador que relutava em
aceitá-lo. No entanto, obedecendo um impulso, deu-lhe a chance.
Deu certo. Ele firmou-se na empresa, desenvolveu
novas aptidões, resolveu seu problema, constatando que foi a partir da oração
que tudo aconteceu, ela criou condições (sintonia) para que um Espírito amigo o
ajudasse.
No entanto, pouco poderia ser feito se o seu
protetor espiritual não contasse com sua iniciativa, já que não seria possível
trazer o emprego até ele.
Os Espíritos jamais deixarão de nos ajudar, desde que,
ligados a eles pela oração, pelos bons pensamentos, pelas boas atitudes,
disponhamo-nos a fazer nossa parte.
Isto está bem claro na máxima enfatizada por Kardec,
em "O Evangelho Segundo o Espiritismo":
"Ajuda-te
que o Céu te ajudará".
Poderá dar-se que o Espírito protetor abandone o seu
protegido, por se lhe mostrar este rebelde aos conselhos?
Afasta-se, quando vê que seus conselhos são inúteis
e que mais forte é, no seu protegido, a decisão de submeter-se à influência dos
Espíritos inferiores. Mas não o abandona completamente e sempre se faz ouvir. É
então o homem quem tapa os ouvidos. O protetor volta desde que este o chame . .
. (questão 495)
O motorista carregou na bebida.
Pesou no pé direito comprimindo o acelerador.
O ônibus ganhou asas.
Os passageiros, assustados, pediam-lhe que reduzisse
a velocidade.
Ele, tranqüilo disse:
-
Não se preocupem. Meu santo é forte!
E voava baixo, ziguezagueando por ruas e avenidas.
-
Devagar, devagar! Cuidado!
-
Calma, gente! Está tudo sob controle. O santo nos protege!
Em pânico, os viajantes começaram a descer, embora
sua insistência:
-
Fiquem frios! Meu santo não falha!
O coletivo esvaziou-se. Restou derradeiro, heróico
passageiro. Segurava-se precariamente ante as freadas bruscas, as curvas
fechadas do bólido sobre rodas.
Não resistiu muito tempo. Arrastou-se até o
motorista, tocou seus ombros e lhe disse:
-
Meu filho, sou seu santo. Também quero descer. Dirigindo assim, nem o
Espírito Santo poderá protegê-lo.
E seguiu solitário o "pé de chumbo", que
acabou esborrachando-se num espetacular acidente que destruiu o ônibus e o
transferiu extemporaneamente para o além.
Determina o bom senso que o pai, após alertar
inutilmente o filho quanto aos seus enganos, deixe-o seguir pelos caminhos
tortuosos que escolheu, afim de que aprenda com seus próprios erros.
Algo semelhante ocorre com nossos mentores
espirituais quando nos comprometemos com vícios e desatinos, fazendo ouvidos
moucos à sua inspiração.
Então nossa vida complica-se, porquanto é graças à
ajuda espiritual que, em múltiplas circunstâncias, problemas são resolvidos,
dores são amenizadas, males são superados, influências nocivas são
neutralizadas.
Há um exemplo sugestivo envolvendo o passe
magnético.
No livro "Missionários da Luz", o espírito
André Luiz informa que muitos de nossos problemas físicos e psíquicos decorrem
de intoxicações espirituais. Estas se acumulam a partir de vícios e
desregramentos, pensamentos infelizes e sentimentos desajustantes.
O passe atua como poderoso elemento de higienização
psíquica que nos alivia amenizando males e acalmando inquietações.
A eficiência do passe não depende apenas da
capacidade do passista ou da receptividade do paciente. Imperiosa a presença de
benfeitores espirituais que direcionem e potencializem os fluidos.
Os efeitos serão efêmeros se o paciente não
modificar seu comportamento, da mesma forma que é ocioso socorrer o alcoólatra
se ele não desenvolve um esforço mínimo por manter-se sóbrio.
Assim, segundo André Luiz, os amigos invisíveis
estabelecem um limite para o atendimento espiritual durante o passe.
Que número seria razoável?
Duas, três ou cinco talvez?
A generosidade deles vai mais longe.
Por dez vezes atendem o paciente.
Se este insiste em destemperos emocionais e físicos
que geram seus males, cessa o auxílio mais efetivo.
É quando o paciente reclama:
- O passe era uma beleza, como um banho de saúde.
Sentia-me leve, tranqüilo . . . Ultimamente não funciona. Será que o Centro
perdeu a força?
Assim como pouco podem fazer os protetores
espirituais em favor de tutelados que não se ajudam, em relação às lutas da
existência, não há porque ajudar àqueles que se prejudicam voluntariamente.
Se dirijo um automóvel de forma imprudente, meu
mentor não irá no pára-choque fazendo malabarismos para proteger-me.
E o funcionário relapso, que chega atrasado, que não
cumpre suas obrigações, que não se dedica ao trabalho? Irá seu protetor sugerir
condescendência ao patrão para que não o demita, se é o que merece?
Na atualidade há quem eleja o roubo por profissão.
Isto em todos os níveis, do estelionato ao assalto à mão armada. Uma atividade,
digamos, de "alta periculosidade". E que poderá o guia espiritual
fazer por esses transviados pupilos senão inspirar o polícia para que os
prenda, evitando que se comprometam mais acentuadamente?
Muitos pedem para Deus "retirar" uma
pessoa do vício. Mas, Deus, não "retirará" ninguém que não queira
sair. Ele, através dos anjos guardiães, a fortalecerá, a inspirará (em vigília
ou durante o sono) e, inspirará aqueles que convivem ou não com aquela pessoa
para que a ajude. Mas não a retirará de algo que escolheu por vontade própria
entrar. Quando não se mostra disposto a ouvir, os guardiães respeitam seu
livre-arbítrio e afastam-se. A faixa de vibração do viciado é baixa. Geralmente
escutam sugestões de Espíritos com a mesma afinidade, estejam encarnados ou
desencarnados. Dificultando assim, a ajuda do Céu.
Confortador, maravilhoso saber que "lá em
cima" há amigos generosos dispostos a nos acompanhar e proteger. Devemos
buscá-los sempre, em oração, aprendendo a ouvir, na intimidade do coração, sua
orientação preciosa.
Consideremos, entretanto, que eles não são babás a
satisfazer nossos caprichos ou prestigiar nossos desatinos.
Quando isso acontece, a melhor ajuda que podem dar é
não dar ajuda nenhuma.
Richard Simonetti
O anjo de
guarda está sempre ao lado de seu protegido?
Richard Simonetti: Não o imaginemos como um pajem a
nos acompanhar nas 24 horas do dia, como se fôssemos criancinhas.
Essencialmente ele é o mentor que, pelos condutos da inspiração, busca nos
orientar nos momentos mais importantes, estimulando-nos ao bem.
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